Na última sessão, antes de encerrar os trabalhos legislativos de 2014, a Assembleia Legislativa de Goiás aprovou a Emenda Constitucional 50/14, que instituiu a carreira de procurador autárquico e reorganizou administrativamente o Poder Executivo. A medida pegou de surpresa a Associação dos Procuradores do Estado de Goiás - Apeg, que, imediatamente, executou uma série de ações conjuntas com a ANAPE para combater os vícios graves de inconstitucionalidade de que a emenda padece. A ANAPE ingressou com a ADI 5215, no Supremo Tribunal Federal logo em seguida.
O Presidente do STF, Ricardo Lewandowski, no despacho proferido em 9 de janeiro, reconheceu a importância da ação e determinou que o Legislativo estadual, no prazo de 10 dias, encaminhasse sua justificativa. A decisão determina ainda que também devem ser ouvidos o Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da República.
Na ação, a ANAPE argumenta que os artigos 1º e 3º da Emenda Constitucional (EC) 50/2014 e o 92-A da Constituição goiana (inserido pela emenda) afrontam a Carta Magna e o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). “A criação de categoria de servidores técnicos com perfil de advogados, funcionando como uma espécie de ‘procuradoria paralela’ ou ‘procuradores paralelos’, para atender a autarquias e fundações estaduais, por iniciativa parlamentar, em processo de emenda à Constituição estadual, configura clara afronta aos artigos 132 da Constituição Federal e 69 do ADCT”, disse a Associação.
A ADIN alerta também que as normas padecem de vício de iniciativa, uma vez que tiveram origem em proposta de emenda constitucional de deputado estadual e não do Poder Executivo local. No aspecto material, destaca que a jurisprudência do STF reconhece que cabe aos Procuradores do Estado “a missão de exercerem a representação judicial e a consultoria jurídica no âmbito da administração direta e indireta dos entes regionais da federação”.
Além disso, observa que a emenda constitucional não é instrumento adequado para promover inovações legislativas sobre órgãos e entidades da administração estadual, cargos, serviços e servidores. "Esses temas devem ser tratados por meio de lei ordinária de iniciativa privativa do governador do estado. Sustenta ainda que as normas afrontam a Carta Magna ainda em seus artigos 37 e 39 ao estabelecer diretrizes para a organização da carreira, inclusive criando quadro transitório de cargos."
Alerta à sociedade quanto aos prejuízos decorrentes da EC 50/14 - Para a Presidente da APEG, Valentina Jungmann, a EC 50/14, que cria a "procuradoria paralela", é inconstitucional e traz insegurança jurídica. "Fomos surpreendidos com essa Emenda, aprovada no fim do ano passado, que traz inconstitucionalidade formal e material", ressalta Valentina.
No entendimento da Procuradora, a intenção da medida é aproveitar servidores públicos e advogados celetistas que já prestam serviço ao Estado e possibilitar a transposição de servidores - que, quando o fizeram, prestaram um concurso público simplificado - para um cargo cujas responsabilidades constitucionais e o processo de seleção são bem mais complexos e de atribuição exclusiva de Procurador do Estado.
Desde a publicação da Emenda, a APEG e a ANAPE têm mantido uma série de reuniões com representantes do governo buscando reverter a situação. No encontro com o Procurador-Geral de Justiça, Lauro Machado, em Goiânia, entregaram a moção de repúdio elaborada pelo Conselho de Procuradores do Estado de Goiás e pediram providências institucionais contra a EC 50/14.
Machado (no centro da foto) informou que o Ministério Público vai decidir quais medidas serão adotadas pelo órgão, depois da análise do material com as informações relacionadas ao questionamento da emenda que criou o cargo de procurador autárquico.
Em seguida, a presidente e o vice-presidente da Associação dos Procuradores do Estado de Goiás (APEG), Valentina Jungmann e Tomaz Aquino, acompanhados do Presidente da ANAPE, Marcello Terto, e outros doze procuradores do Estado, estiveram reunidos com o novo Secretário de Governo, Henrique Tibúrcio, para tratar da EC 50/14. "Não apoiei a iniciativa dos gestores jurídicos. Apenas atuei como mediador enquanto era presidente da OAB-GO", garantiu Tibúrcio (foto).
Já o Secretário da Casa Civil, José Carlos Siqueira, após conhecer as razões apresentadas contra a Emenda Constitucional nº 50/2014, assumiu o compromisso de repassá-las ao governador Marconi Perillo.
Terto lembrou que a medida também vai contra a reforma administrativa implantada nos últimos meses no Estado de Goiás, pois, ao invés de estruturar a PGE, cria uma procuradoria PARALELA. Pessoas que não passaram no concurso para procurador estão tentando elevar o status dos seus cargos. O concurso de procurador do Estado é muito extenso, longo, quatro fases, provas objetivas pesadas, subjetivas em três grupos, provas orais e de títulos, para assumir a competência constitucional exclusiva de orientar juridicamente e representar judicialmente a unidade federada. Começa por aí. Eles, para ganhar peso político, o que fizeram? Organizaram alguns advogados celetistas mais antigos – o vínculo nem estatuário é — e começaram a encampar esse projeto junto à esfera política. Em momento algum o órgão constitucional competente foi consultado. Passaram por cima e ignoraram. Competências constitucionais tanto da Assembleia quanto do Governador encontram limites. Goiás não precisa de outra procuradoria, não precisa de um outro órgão, outra estrutura com procurador geral, chefias, áreas de gestão e planejamento, principalmente agora, quando o Estado de Goiás está em um frnaco processo de contenção de despesas, com uma reforma que está enxugando a máquina pública e não a expandindo. Essa emenda vai de encontro com todo o contexto e a Constituição Federal”.
Terto observa que existem reiteradas decisões do STF no sentido de que isso é inconstitucional, em primeiro lugar, porque usurpa competência exclusiva dos procuradores do Estado; depois, porque viola a regra de que só pode existir a Procuradoria Geral do Estado [PGE] para prestar esses serviços no âmbito da unidade federada, viola a regra do concurso público, viola a vedação de equiparação remuneratória entre servidores, para não falar das inconstitucionalidades formais. Esse assunto não pode constar de emenda à Constituição, porque é matéria de lei ordinária. "Essa emenda atende apenas o interesse corporativo das pessoas diretamente interessadas. Não vamos admitir, como responsáveis pelos interesses jurídicos do Estado de Goiás, que um verdadeiro trem da alegria prevaleça contra o interesse público."