Confira, o artigo de autoria da Procuradora do Estado de São Paulo, Marcia Semer, Presidente da APESP, sobre a nova proposta de Lei Orgânica para a PGE-SP.
Uma proposta que assombra
Márcia Semer
Está para chegar ao governador Geraldo Alckmin, com proposta de encaminhamento à Assembleia Legislativa, minuta de projeto de lei elaborada pelo seu procurador-geral do Estado, Elival da Silva Ramos.
O protesto reduz o controle dos procuradores do Estado de São Paulo sobre a legalidade de licitações, contratos, convênios e processos administrativos disciplinares.
Também oferece advogados do Estado, pagos pelos contribuintes, para a defesa de autoridades e ex-autoridades e cria no gabinete do procurador-geral assessoria destinada apenas a defender o próprio procurador e o governador nas ações contra eles propostas.
Essa proposta de edição de nova lei orgânica para a PGE-SP, que pretende modificar legislação modernizada recentemente --ainda na gestão José Serra--, foi enviada à Casa Civil do Estado e tem dado muito o que falar. Desde que souberam das mudanças propostas, os procuradores têm tentado em vão dialogar para alterar os pontos que consideram prejudiciais ao Estado.
A Apesp, entidade que presido e que congrega mais de 90% dos procuradores, entende fundamental a realização de amplo debate para melhorar e mesmo modernizar a advocacia prestada pela Procuradoria de São Paulo, para o bem do Estado e da população. Mas não concordamos com a gestação de propostas elaboradas, como é o caso do projeto em comento, de uma forma unilateral, sem diálogo efetivo com os membros da carreira.
Preocupa sobretudo a fragilização do procurador da banca, transformando a advocacia de Estado numa advocacia de governo. O projeto ainda amplia o rol de cargos em comissão, aumenta assessorias diretamente ligadas ao procurador-geral, fortalece seu poder para livres designações e atribui ao Conselho da Procuradoria do Estado, tradicionalmente um órgão superior, função de mero auxiliar do procurador-geral.
No momento em que é mais sensível no país a preocupação com a lisura e o estabelecimento de mecanismos de fiscalização dos bens e serviços públicos, enfraquecer o controle sobre a legalidade dos negócios estatais, em verdadeira variante interna da PEC 37, é tudo de que não precisamos.
Na era do direito de acesso à informação, a proposta vem sendo gestada sob a marca da opacidade, o que motivou os membros eleitos do conselho a requererem diretamente ao governador a ciência sobre o conteúdo atual do projeto.
Os procuradores do Estado não admitem ser tratados como ocupantes de cargos de desconfiança. São os profissionais que produzem em seu cotidiano o controle da legalidade das licitações e contratos da administração.
Se em muitos casos prevenir é melhor do que remediar, na tutela dos bens públicos a situação é ainda mais dramática. Quando o dinheiro se esvai sem controle, a chance de seu retorno é quase sempre remota. É por isso que a Constituição concebeu a advocacia pública como função essencial à Justiça, com atribuições estritas e indelegáveis: para evitar que a administração dos bens e interesses públicos se faça à sombra da legalidade e, com isso, produza monstros capazes de assombrar o futuro de todos nós.
*Presidente da Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo (Apesp)